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    Capítulo 01: O processo criativo na fotografia

    Faz quase 200 anos que a fotografia está entre nós e ainda tem muita pra descobrir. Vamos nessa!

    Hoje em dia, estamos dominando mais os aparelhos pela evolução das câmeras, pela facilidade dos recursos automáticos, pela “tentativa e erro” para a qual, muitas vezes, nos convida a tecnologia digital e por muitos outros motivos. Questões automáticas de luz ou recorte, por exemplo, ficam bastante facilitadas com o uso dos celulares. Mas outros aspectos seguem obscuros na fotografia amadora e, às vezes, também na foto profissional.

    Como se faz uma foto?

    De onde surge uma foto na nossa cabeça? E como ela chega no resultado final?

    Quais são os caminhos criativos que temos à disposição?

    Onde se vê o processo de criação de fotografia?

    Para tentar esclarecer questões como essas, vamos apresentar e discutir alguns caminhos criativos que o fotógrafo pode escolher quando cria uma foto, com ênfase no uso da Linguagem fotográfica.

    E para tentar enxergar o uso dessa linguagem, na prática, buscamos apoio em uma metodologia que surge na Literatura, a Crítica Genética. Essa é uma área de pesquisa científica que considera os “documentos de processo” de autores de qualquer tipo de obra, embora tenha surgido nos estudos de acervo de autores literários importantes. Os tais “documentos de processo” seriam os registros materiais do caminho criativo trilhado, com os erros e acertos, com as escolhas felizes e as nem tanto.

    Vamos ver mais sobre isso na sequência.

    Este site é parte resumida e revisada de uma pesquisa acadêmica de doutorado que teve como objeto o trabalho do fotógrafo Tiago Santana (Crato/CE, 1966), em seu livro O Chão de Graciliano, publicado em 2006 em parceria com o jornalista Audálio Dantas.

    Para seu trabalho de campo, o pesquisador e aqui autor Marcelo Juchem analisou o livro final, conseguiu acesso ao acervo do fotógrafo (equipamentos, suprimentos, negativos, testes de impressão etc.) e fez várias entrevistas com ambos autores e outros sujeitos. Ao longo de três anos o então doutorando Marcelo leu, escreveu, identificou “documentos de processo” relevantes e os categorizou e analisou para, ao fim, discutir o uso da Linguagem fotográfica pelo fotógrafo Tiago Santana.

    Mas, aqui neste site, como o próprio nome diz, temos uma abordagem sobre algumas das diferentes maneiras de pensar e colocar a linguagem na prática: Linguagem fotográfica: modos de usar.

    Veja, por fim, que não se trata “do modo” de usar, como se tivesse apenas um ou “O melhor”. Aqui trata-se de apresentar e discutir diferentes caminhos de aplicar (ou desenvolver?) a Fotográfica.

    Como ver o invisível?

    Para entender melhor como livros são escritos, passou-se a estudar os processos anteriores ao dito “ponto final” da história, ou seja, ver e analisar as diferentes versões de rascunho, os manuscritos, os erros apagados, os erros que viraram acertos, os recortes e vários outros materiais de inspiração para uma obra literária, como mapas, esquemas, diários, fotos, recortes de jornais etc..

    Não há regra, pois, a princípio, tudo pode importar na criação de uma história.

    De certa maneira, o pesquisador de Crítica Genética, o geneticista, deverá buscar o olhar mais amplo para a criação daquela obra, seja no acervo do autor (organizado ou nem tanto), ou na sua fortuna crítica, ou ainda através de entrevistas com o autor ou outros sujeitos que possam ter se envolvido. A partir desse conjunto de materiais e documentos, o pesquisador geneticista deverá selecionar os mais adequados para analisar em busca do processo criativo.

    Desde o início já se sabe que é uma espécie de “busca sem fim”, pois não se trata de encontrar o ponto original ou a melhor “fórmula” para criar um livro ou qualquer outra obra de arte. Trata-se de entender melhor como funciona o processo criativo. Ou melhor: os processos criativos, essa capacidade humana tão encantadora.

    A Crítica Genética surgiu nos anos 60, na França, a partir dos estudos do acervo do poeta alemão Heinrich Heine. Para estudar o dossiê do escritor, desenvolveu-se esta metodologia que pretendia visualizar melhor os processos.

    Pino e Zular (2007) apontam na crise de maio de 1968, na França e na Europa, em geral, o estopim destes questionamentos e, em autores já clássicos, como: Barthes, Proust, Kristeva, Genette, Todorov e Bakhtin, as reflexões seminais que levaram ao desenvolvimento das propostas geneticistas. Na prática, foi na Biblioteca Nacional da França em 1968 que um grupo de estudiosos deparou-se com um conjunto de materiais que incluía manuscritos do poeta alemão Heinrich Heine. Ao estudá-los, o grupo percebeu a possibilidade de um olhar mais rico e aprofundado do que os propostos até então pela filologia que, embora também trabalhe com manuscritos, prima pela busca das origens de um texto e/ou de uma língua. Percebeu-se a possibilidade de tentar observar o processo criativo do poeta, de identificar alguns dos caminhos trilhados em relação não só às escolhas finais, mas também às rasuras e aos questionamentos do autor, ou seja, refletir sobre a criação artística de maneira mais objetiva.

    Isso ocorreu num “momento em que a produção em ciências humanas é avaliada a partir de critérios das ciências exatas” (PINO e ZULAR, 2007, p. 12), e poucos anos depois, em 1982, surgia o Institut de textes et Manuscrits Moderns (ITEM) ligado ao Centro Nacional de Pesquisa da França (CNRS), polo de pesquisas geneticistas até hoje. Como se pode ver, a Crítica Genética surge a partir de novos questionamentos sobre objetos pouco estudados, o que lhe confere um caráter bastante peculiar, original e desafiador, características que ainda perduram nas diferentes abordagens geneticistas. (JUCHEM, 2018, p.32-33).

    Livro

    Escrever sobre escrever: uma introdução à Crítica genética

    Claudia Amigo Pino e Roberto Zular
    WMF Martins Fontes
    2007

    O instituto Institut des textes et manuscrits modernes (ITEM) disponibiliza muito material gratuito como publicações e programação de Seminários, inclusive contemplaram a fotografia como tema central de uma das suas publicações principais, a revista Gênesis, em 2015:

    Porém, curiosamente, até hoje os geneticistas franceses parecem pensar a fotografia como uma espécie de apoio, de inspiração a outras obras e não como uma expressão artística específica cujos processos criativos seriam passíveis de se analisar individualmente. Ponto pra nós, geneticistas brasileiros!

    Chegando no Brasil, nos anos 80, através do pesquisador francês Philippe Willemart, a Crítica Genética ampliou bastante seus horizontes e atualmente considera diversas formas de expressão artística, como dança, cinema, teatro, música etc.. A professora e geneticista Cecília Almeida Salles tem desenvolvido muitos trabalhos desde essa época, e concorda que o olhar da Crítica Genética é adequado não só à criação literária, mas a todas expressões artísticas:

    Os críticos genéticos juntam-se a todos aqueles que se sentem atraídos pelo processo criativo e fazem dessas pegadas, que o artista deixa de seu processo, uma forma de se aproximar do ato criador, e, assim, conhecer melhor os mecanismos construtores das obras artísticas. A Crítica Genética pretende oferecer uma nova possibilidade de abordagem para as obras de arte: observar seus percursos de fabricação. É, assim, oferecida à obra uma perspectiva de processo. (SALLES, 2008, p. 21)

    Livro

    Crítica Genética: fundamentos dos estudos genéticos sobre o processo de criação artística

    Cecília Almeida Salles
    EDUC
    2008

    Mas tentar entender o processo criativo é apenas exercício intelectual de pesquisadores? Ou de professores universitários ávidos por impressionar seus alunos com nomes bonitos?

    Ou seria apenas uma mera curiosidade aos especialistas?
    Será que o público em geral se interessa por tudo isso?

    Cabe lembrar que em muitas situações o processo, o caminho, o trajeto é tão interessante, ou até mais, do que o resultado. Conhecer as dores e os amores de quem cria valoriza mais o esforço dos próprios criadores, e pode nos ensinar coisas importantes, seja como público, seja como autores.
    Mais do que um mero e sempre curioso making of, como é comum no cinema e audiovisual, pensar a gênese de uma obra é tentar entender os ímpetos criativos do autor, as encruzilhadas da criação, as escolhas, os acertos e os erros ao longo de um trajeto, para que os próximos trajetos criativos sejam realmente efetivos, criativos e válidos.

    Olhando um pouco mais pro nosso contexto brasileiro, temos alguns espaços especiais de pesquisa, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, ou como a Pontifícia Universidade Católica, PUC, de São Paulo e a do Rio Grande do Sul, para citar apenas três importantes Instituições de Ensino Superior, suas pessoas e seus centros de pesquisa, além de diversos pesquisadores espalhados por todo o Brasil.

    Ainda aqui no sul do país, na Universidade Federal de Santa Catarina, a UFSC, temos também o Núcleo de Estudo de Processos Criativos, o Nuproc.

    Nós, geneticistas, estamos até organizados, e se você se interessou pelo assunto fique atento às atividades, publicações, congressos e afins da Associação de Pesquisadores em Crítica Genética, a APCG, em diferentes espaços online e físicos.

    Além disso, existe essa revista científica da USP, Universidade de São Paulo, e da APCG com muita coisa boa, a Manuscrítica – Revista de Crítica Genética, que, desde “1990, publica textos que dialogam com a Crítica Genética, disciplina que estuda os processos de criação em diversas áreas, como a literatura, as artes visuais, o teatro e o cinema, entre outras.”

    Nessa revista, de proposta e linguagem bastante acadêmica, existem hoje diversos trabalhos que versam sobre fotografia e que você pode conferir clicando aqui.

    Este trabalho, por exemplo, da pesquisadora Patricia Kiss Spineli e do professor Edson do Prado Pfützenreuter, ambos doutores, discute o uso da folha de contato e os rastros deixados nestas.

    A folha de contato é uma das primeiras etapas de visualização das imagens registradas no negativo analógico: após a revelação dos negativos do filme, é comum produzir a folha de contato com todas as imagens no tamanho do próprio filme, num visual bastante característico, e possibilitando anotações, novos cortes e enquadramentos, relações entre as imagens daquele filme e leituras diversas. No trabalho, são discutidos diversos exemplos que compõem a publicação Magnum: Contatos (2012), além de outros casos conhecidos, como o de Henri Cartier Bresson.

    Aqui um exemplo de uma folha de contato usado pelos fotógrafos para escolher qual foto ampliar. Imagem por tomylees licenciado por CC BY-NC-SA 2.0.

    Já na pesquisa do doutor Cassiano Cordeiro Mendes são abordados os DVDs Contacts, de 2015, no qual diversos fotógrafos do mundo inteiro revisitam, analisam e comentam seus próprios negativos e folhas de contato.

    E, pra finalizar, também tem outro artigo que tem muita relação com este site: Gênese fotográfica: um fotolivro como registro e processo de criação fotográfico, do autor deste site, Marcelo Juchem, que ao longo dos seus estudos de doutorado já foi divulgando alguns achados parciais.

    Este artigo trata-se, em linhas gerais, de uma divulgação sobre o uso do fotolivro para ilustrar a criação fotográfica, quando no andamento da pesquisa já tínhamos identificado e categorizado os “documentos de processo” a analisar. Ao invés de descrevê-los textualmente, eu e minha estimada orientadora, a Profa. Dra. Márcia Ivana de Lima e Silva decidimos apresentá-los em forma de fotolivro, que aliás será devidamente discutido no capítulo 3 deste site.

    Resumo do artigo:

    A crescente importância das imagens na sociedade contemporânea faz com que estudos sobre fotografia passem a receber mais atenção, lenta mas gradualmente, inclusive em suas relações com outras áreas como a Literatura. No âmbito da Crítica Genética, estudos sobre criação da fotografia são muito raros e, neste sentido, este trabalho propõe-se a ilustrar o processo de criação fotográfica da obra O Chão de Graciliano, apresentando-o com o fotolivro Fotográficos Documentos do Processo Fotográfico, que inclui alguns dos registros dos documentos de processo do fotógrafo Tiago Santana. Pretende-se valorizar a mídia fotográfica em si, apresentando o processo de criação a partir de novos registros fotográficos neste suporte contemporâneo e pertinente que é o fotolivro, excelente formato para divulgação de pesquisas genéticas.

    O nosso processo de pesquisa e divulgação parcial dos resultados deu muito certo, sendo inclusive recebido em algumas bibliotecas e fototecas fora do país. Veja só:

    Pois foi assim, baseado “nesta tal” Crítica Genética e seus “documentos de processo”, que visualizamos o processo criativo do fotógrafo Tiago Santana e analisamos seu uso da Linguagem fotográfica.

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